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Delírio do Moscardo

"devagar, o tempo transforma tudo em tempo. o ódio transforma-se em tempo, o amor transforma-se em tempo, a dor transforma-se em tempo." José Luís Peixoto

Delírio do Moscardo

"devagar, o tempo transforma tudo em tempo. o ódio transforma-se em tempo, o amor transforma-se em tempo, a dor transforma-se em tempo." José Luís Peixoto

28.Jun.12

O Anel de Giges

Devido a uma grande tempestade e tremor de terra, rasgou-se o solo e abriu-se uma fenda no local onde ele apascentava o rebanho. Admirado ao ver tal coisa, desceu por lá e contemplou, entre outras maravilhas que para aí fantasiam, um cavalo de bronze, oco, com umas aberturas, espreitando através das quais viu lá dentro um cadáver, aparentemente maior do que um homem, e que não tinha mais nada senão um anel de ouro na mão. Arrancou-lho e saiu (...) 

 

 

 

 

Admirado, passou de novo a mão pelo anel e virou para fora o engaste. Assim que o fez, tornou-se visível. Tendo observado estes factos, experimentou, a ver se o anel tinha aquele poder, e verificou que, se voltasse o engaste para dentro, se tornava invisível; se o voltasse para fora, ficava visível. Assim senhor de si, logo fez com que fosse um dos delegados que iam junto do rei. Uma vez lá chegado, seduziu a mulher do soberano, e com o auxílio dela, atacou-o e matou-o, e assim se assenhoreou do poder.

 

 

Platão, A República, Livro II

24.Jun.12

Entre a apatia e a alienação

   No período azul, a temática da solidão, pobreza, apatia e morte são dominantes. Em contraste, o discurso de Picasso é sempre o do inconformismo.

 

(…) nunca considerei a pintura como arte de puro entretenimento e distracção. Através do desenho e da cor, pois que eram estas as minhas armas, pretendia penetrar de forma cada vez mais profunda no conhecimento do mundo e dos homens, para que este conhecimento nos fizesse mais livres dia após dia… Sim, tenho consciência de ter lutado com a minha pintura como um verdadeiro revolucionário…

 

 

                                         Os Pobres na Praia, Picasso, 1903

 

 

Na nossa miserável época importa sobretudo despertar o entusiasmo. Quantas pessoas leram realmente Homero? E no entanto todo o mundo fala dele. Assim nasceu a lenda Homero. E uma tal lenda tem o poder de constituir um valioso incentivo. Entusiasmo é o que mais falta nos faz, a nós e à juventude.

Pablo Picasso

23.Jun.12

Superclasse

   Ao ver o fascinante Cosmopolis, de Cronenberg, não pude deixar de recordar o livro Superclasse. Neste, David Rothkopf, faz um relato da elite composta por algumas centenas de pessoas que, através de um poder em muito casos desmesurado, têm influência para alterar, por vezes de forma destrutiva, a vida de milhões.

A realidade é que o valor líquido acumulado das cerca de mil pessoas mais ricas do mundo - os bilionários que existem no nosso planeta - é quase o dobro do valor líquido dos cerca de 2,5 mil milhões de pessoas mais pobres de todo o mundo. A raça humana pode ter feito progressos enormes ao longo dos séculos, mas estas disparidades são uma acusação directa à nossa civilização. E acredito que também são uma ameaça à própria estabilidade da nossa civilização.

(…)

Quem dará o passo para que as coisas mudem, desta vez? Que forma terá essa iniciativa? As actuais elites voltarão a ser depostas por outras elites, agindo em nome do povo mas representando, na realidade, os seus próprios interesses mais restritos? Ou o progresso acabará por oferecer uma prova duradoura de que a verdadeira estabilidade assenta no equilíbrio: entre a liberdade e a justiça, entre o crescimento e a igualdade, entre o mercado e o Estado e entre o punhado que lidera e os outros, nós todos, de quem deve emanar a legitimidade do líderes?

David Rothkopf, Superclasse

19.Jun.12

Era uma vez na Holanda

   Uma história de tulipas. Era uma vez uma espécie de tulipa especial. Ao contrário das vulgares tulipas, possuía listas brancas que entremeavam o pigmento da flor, deixando as pessoas muito mais fascinadas. Na realidade, estas flores estavam contaminadas por um vírus, mas isso não vem ao caso... Esta tulipa fascinava de tal forma os holandeses, que estes chegavam a gastar uma verdadeira fortuna: o preço de uma casa em Amsterdão. Por azar, a flor só florescia na Primavera. Mas nada que impedisse o negócio: os floricultores passaram a vender títulos dos bolbos, ainda sem flor. Os compradores podiam esperar que a flor nascesse ou, ainda melhor, podiam vender os títulos no futuro com uma bela margem de lucro, tal era a valorização dos mesmos. Os mais "espertos" não chegavam a gastar um florim: podiam contrair um empréstimo para comprar títulos durante a manhã e vendê-los à tarde com lucro. Negócio garantido, tirando um pequeno problema: a quantidade de compradores dispostos a pagar o preço de uma mansão por uma flor é um recurso finito. Em simultâneo, descobriram-se umas falcatruas: muitos floricultores vendiam mais títulos do que os bolbos que possuíam, e algumas vezes nasciam simplesmente tulipas normais (nem todas eram infectadas pelo vírus). Como consequência, o "mercado" entra em desconfiança e o valor dos títulos cai abruptamente. Simples psicologia de massas. O resultado foi uma economia de rastos e pessoas na miséria. Claro que isto foi no séc. XVII. Desde então a raça humana evoluíu, cresceu, maturou, e não se espera que tal aconteça de novo. Com certeza que não.

 


Que não seja imortal,  

posto que é chama,

mas que seja infinito

enquanto dure...

 

Vinícius de Moraes

 

 

Adaptado de Crash! Porque é que as economias vão ao fundo, de Alexandre Versignassi

14.Jun.12

Politeia

   O Moscardo questiona, provoca, critica, insinua. Busca a verdade e a razão... 

 

  

- É esta, meu caro amigo, a extensão e a qualidade da perdição e corrupção da melhor das naturezas para se exercer uma profissão superior, natureza, aliás, pouco frequente, como dissemos. É de homens dessa espécie que provêm os que fazem o maior mal às cidades e aos particulares, e os que fazem o maior bem, quando se der o caso de se deixarem arrastar para esse lado. Mas uma natureza medíocre jamais fará algo de grande a alguém, seja a um particular, seja a uma cidade.

  

Platão, A República, Livro VI