Refu(n)didos
Já sabemos o que pretende o governo com o relatório do FMI. Expor medidas que pretende implementar, seja por não ter coragem de as apresentar directamente, por aparentar ponderação ao enveredar por apenas algumas ou para alinhar no velho espírito bacoco de que o que vem de fora é bom.
Na realidade, tudo o que é apresentado no relatório é falacioso, o que devia ser surpreendente, vindo de uma instituição tão preponderante a nível global. Começa pela premissa errada: não se trata de uma discussão sobre o papel do Estado Social, trata-se sim de como cortar 4 mil milhões de euros na despesa pública. Fá-lo usando dados incorrectos, vagos e desactualizados em valores do orçamento de estado, no conceito de forças de segurança, nos salários médios dos trabalhadores do privado vs trabalhadores do Estado, nos valores das pensões. E mais: não tem em conta o imenso atraso educacional que Portugal teve que reduzir nas últimas décadas, não se preocupa em resolver problemas de gestão no seio de organizações estatais, sugere um peso excessivo da função pública, em relação a outros países europeus, sem ter em conta as funções do Estado que temos, e despreza o efeito recessivo e social que o despedimento de dezenas de milhares de funcionários públicos geraria.
Ao contrário do que foi sugerido, o relatório não põe a nu muitas das nossas deficiências. Pela simples razão de que isso implicaria ter havido um estudo exaustivo prévio da sociedade e burocracia portuguesas, e não uma descarada exposição de ideologia ultraliberal alinhavada por uma duvidosa análise numérica. Isto vale zero. Ainda assim, merece a nossa atenção. Quanto mais não seja para chegar a esta conclusão.